Na economia digital, a coleta e análise avançada de dados se tornaram fundamentais para oferecer uma experiência ao cliente personalizada. Mas, enquanto a tecnologia avança para tornar isso uma realidade, como é possível equilibrar personalização e privacidade? Ou, como criar uma governança de dados eficiente sem gerar entraves operacionais?
Questionamentos neste nível têm surgido porque a maioria das empresas já entendeu a importância dos dados para melhorar a experiência do cliente. Hoje, o desafio não está mais no "porquê", mas no "como" - como utilizar essas informações de maneira estratégica? Como engajar outros times para adotar uma cultura orientada a dados?
Isso não significa que não existam mais resistências para chegar neste lugar, principalmente em setores mais tradicionais. Certas empresas e equipes ainda seguem a lógica do "sempre fiz assim" – seja o trade que insiste em anunciar na novela das nove ou o varejo que não quer abandonar o panfleto impresso com as ofertas da semana. Por instinto, o ser humano evita mudanças – afinal, caminhos novos podem trazer perigos desconhecidos.
Em meio a tudo isso, a ideia não é fazer mudanças radicais, mas sim acrescentar camadas à estratégia existente. Ou seja: uma marca não precisa parar de imprimir panfletos ou fazer o tal anúncio no comercial da novela, mas sim entender melhor o impacto destas iniciativas e distribuir investimentos de forma mais direcionada. Ao mesmo tempo, este processo precisa levar em conta boas práticas em relação a governança e a privacidade.
Conciliando interesses
Quando o assunto é a evolução para uma experiência personalizada do cliente, é importante lembrar que a governança de dados é essencial. Este ponto é relevante não apenas para garantir a eficiência das estratégias de marketing, mas também o cumprimento das regulamentações de privacidade.
Problemas que tendem a acontecer nesta frente brotam quando cada área mantém sua própria base de dados, o que cria silos de informações, dificultando bastante a gestão de consentimento.
Se existem múltiplos repositórios de dados, como é possível garantir, por exemplo, que quando um cliente pede que seus dados sejam excluídos, todas as áreas irão cumprir essa solicitação?
Por isso, centralizar informações é tão importante. Isso é relevante não só no sentido de melhorar a experiência do cliente, mas para garantir o cumprimento da lei – tanto para abordar pessoas que deram consentimento, quanto para remover da base aquelas que solicitaram a exclusão.
Outro ponto crucial é a definição clara de termos dentro da organização. Quando se fala de "cliente ativo", cada área pode ter sua própria interpretação. É fundamental estabelecer um consenso entre as áreas, de preferência com processos definidos por quem tem visão ampla do dado, do cliente e da estratégia da empresa.
Privacidade e LGPD
Com a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), as empresas tiveram que se adaptar às novas exigências no que diz respeito a garantir a privacidade das pessoas com as quais se relacionam. Na prática, muitas das orientações já existiam – a diferença é que agora o cliente consente de forma explícita.
Quando um cliente se identifica para um programa de fidelidade ou baixa um aplicativo aceitando uma política de dados que uma empresa coloca, ele está consentindo com a coleta e uso de suas informações. O ciclo é completo e se configura da seguinte forma: se o cliente fornece suas informações, em troca este cliente espera uma experiência personalizada.
E muitos consumidores entendem esse benefício mútuo. Uma vez, ouvi de um cliente em uma palestra: "Eu fico feliz em compartilhar meus dados, porque não quero receber um monte de propaganda de produtos que não fazem sentido para mim. Quero promoções direcionadas."
O posicionamento da marca em relação à transparência também é crucial. Algumas empresas, como o Nubank, comunicam claramente qualquer alteração em seus termos e enviam comunicações detalhando tudo o que mudou para a sua base. Isso reflete o respeito pela escolha do cliente, além de fortalecer a confiança na marca.
Hiperpersonalização com respeito
O estado da arte na utilização de dados é a hiperpersonalização – entregar uma versão da sua empresa para cada cliente. É quase como se, em um supermercado físico, você pudesse reorganizar as gôndolas para cada pessoa que entra, colocando na frente dela exatamente o que ela precisa, naquele dia.
No mundo digital, isso é perfeitamente possível. Não apenas na experiência de compra, mas em toda a jornada de atendimento, posicionamento e comunicação. Um chatbot que usa expressões regionais adequadas ao cliente, ofertas customizadas baseadas no histórico de compras, uma navegação intuitiva que se adapta às necessidades individuais. O céu é o limite.
Mas, essa hiperpersonalização só funciona com dados. E neste ponto, surge a necessidade de equilíbrio com o qual marcas precisam lidar: se um cliente opta por não compartilhar suas informações, sua experiência pode ser genérica – e potencialmente inferior. Algumas marcas, inclusive, adotam um posicionamento claro em relação a isso, abordando o assunto de forma explícita: precisamos dos seus dados para te entregar uma experiência incrível. Se você não quer compartilhar estas informações, talvez não iremos conseguir te oferecer o melhor.
O que tomadores de decisão precisam ter em mente é que a estratégia mais eficaz é colocar o cliente no centro. Entender o que é melhor para ele, independentemente da área – seja marketing, financeiro ou tecnologia. A estratégia da empresa deve orientar a forma como as áreas colaboram e envolvem os responsáveis pela governança.
Este processo não pode ser definido de forma isolada. Deve envolver o negócio, escutar as necessidades e entender como a informação precisa chegar para dar autonomia aos departamentos relevantes, garantindo assim, toda a linhagem do dado em questão.
E por que é importante fazer tudo isso? Os consumidores hoje estão mais exigentes e desejam interações personalizadas – 78% dos clientes esperam isso, segundo um relatório da consultoria McKinsey.
Com a digitalização acelerada pela pandemia, ficou muito mais fácil comparar empresas e, até mesmo, trocar de fornecedor. Neste cenário fluido, marcas precisam fortalecer sua relação com os clientes, lembrando que é possível oferecer experiências relevantes e ao mesmo tempo respeitar as escolhas deles. Empresas que conseguirem equilibrar personalização e privacidade serão as vencedoras na nova ordem digital.
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